• Eliane Silva
Atualizado em

Um hambúrguer com limites de colágeno, maior percentual de gordura, indicação precisa no rótulo do corte de carne utilizado e com possibilidade de ser oferecido ao consumidor em formato diferente do tradicional disco. Esses pontos fazem parte do texto da nova portaria de identidade e qualidade do hambúrguer que a Secretaria de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) submeteu a consulta de 60 dias na última quarta-feira (20/10).

A portaria, que só é aplicável ao hambúrguer produzido em estabelecimentos com o selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF), mantém a descrição de hambúrguer como produto cárneo industrializado obtido da carne moída dos animais de açougue, adicionado ou não de tecido adiposo e ingredientes. Mas aumenta o percentual máximo de gordura, de 23% para 25%, e estabelece que a embalagem deve ter a especificação do corte de carne (bovina, suína, ave, pato, coelho). Se houver mais de um corte, deve constar no rótulo principal, com os percentuais de cada um.

hambúrguer-orgânico-korin (Foto: Divulgação )

Portaria do Ministério da Agricultura abriu consulta pública para discutir os padrões do hamburguer (Foto: Divulgação )

Os carboidratos totais máximos são mantidos, em 3%, e o percentual mínimo de proteína também: 15%. Outra novidade é que, se o produto for recheado, também deverá ser informado. O uso de queijos e vegetais é permitido na formulação do recheio.

Segundo a diretora do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal, Ana Lúcia Viana, o objetivo da nova proposta de revisão normativa é harmonizar o Registro de Identidade e Qualidade (RTIQ) com o Decreto 9.013/2017, que trata da inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal, bem como englobar atualizações necessárias levantadas pelo setor e pelo próprio Mapa ao longo dos últimos anos.

Ana Lucia da Silva Corrêa, diretora do Centro de Tecnologia de Carnes (CTC), do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), ligado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, diz que a portaria representa um grande avanço em relação ao texto em vigor desde 2000, baseado em um decreto de 1952. “O grande ganho é a inclusão dos limites de colágeno como padrão de qualidade”, explica a engenheira de alimentos que trabalha com carnes há 26 anos.

O colágeno é uma proteína fibrosa, estrutural e de origem animal, que forma fibras resistentes. Para hambúrguer de carnes bovinas ou suínas e de mais de uma espécie de carne, a portaria estabelece que quantidade de colágeno não pode passar de 20% em relação à proteína total. Já nos de aves e coelhos, o máximo é 8%.

O excesso de colágeno, diz el, gera um produto de qualidade nutricional inferior. “Nenhuma empresa vai colocar no mercado um produto com muito colágeno porque falta carne e fica difícil de mastigar. Agora, empresas de pouco idoneidade podem servir o produto em licitações da merenda escolar ou de refeições para presídios.”

Ana Lucia diz que o Ital é frequentemente consultado por prefeituras que compram hambúrguer em licitações e querem estabelecer parâmetros para não receber um produto de qualidade inferior ao que se compra no supermercado. “A nova portaria vai dar esses parâmetros para permitir a identificação de fraudes ou problemas de segurança alimentar.”

Padrão e premiun

Segundo a diretora do Ital, houve muitos avanços em tecnologia de alimentos em 20 anos e a portaria acerta ao aumentar o limite de gordura para 25%, que, na prática, já é aplicado no hambúrguer premium, que é mais suculento que o produto padrão.

Ana Lucia Viana, a diretora do Departamento de Inspeção, pondera que que 25% é o valor máximo permitido e as empresas poderão elaborar produtos com menores teores de gordura, conforme exigência do mercado. “O aumento do limite de gorduras foi motivado pela crescente demanda de produtos gourmets.”

O que a diretora do Centro Tecnológico de Carnes do Ital não gostou foi a retirada dos limites de cálcio, que eram de 0,1% no produto cru e 0,45% no cozido. Segundo ela, cálcio também é parâmetro de qualidade.

Nos produtos comercializados cozidos, o padrão de qualidade cai porque, na separação mecânica, diferentemente da desossa manual, são incluídos mais ossos para obter rendimento. O novo texto só indica que a adição de carnes obtidas por processos de separação mecânica só é permitida no hambúrguer cozido e não pode passar de 30%.

A especialista diz que a portaria favorece a transparência tanto para as empresas quanto para os consumidores, embora os países desenvolvidos sejam mais restritivos em termos de nomenclatura. “Lá fora, não pode ser chamado de hambúrguer se tiver proteína de soja, por exemplo. Talvez daqui a alguns anos, a gente chegue lá”, diz Ana Lucia da Silva Correa. Ela avalia que é importante as associações de consumidores, empresas do setor, nutricionistas e outros profissionais façam contribuições à portaria.

A reportagem tentou, sem sucesso, ouvir a Marfrig, um dos maiores fabricantes de hambúrguer do país, e o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). A empresa alegou que não iria participar e o instituto respondeu que não tinha ainda análise das mudanças. 

Além do hambúrguer, o Ministério da Agricultura está colocando sob consulta a revisão de outros produtos de origem animal. Já foram lançadas as sugestões para a carne moída e o presunto. Devem sair ainda o RTIQ do quibe, lombo, bacon, carne bovina salgada e outros produtos.