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Síndrome de Haff ou Doença da urina preta

Com essa nota, tento esclarecer a opinião pública e fornecer algumas informações que estão disponíveis até o momento sobre a Síndrome de Haff, que ainda é um enigma e está sendo investigada por especialistas do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), juntamente com os Laboratórios Federais de Defesa Agropecuária do MAPA (LFDA), o Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) e o Ministério da Saúde.

O que é a Síndrome de Haff?

A Síndrome de Haff, ou Doença da urina preta, também conhecida como rabdomiólise, é uma doença cujo quadro clínico inclui o súbito aparecimento de dores musculares, dormência no corpo, rigidez muscular e a característica principal é o rompimento das células musculares, que se chama tecnicamente de rabdomiólise. Este rompimento de células musculares faz com que ocorra a liberação de mioglobulina e outras enzimas musculares, ocasionando a mioglobinúria, que é a urina escura, que pode resultar em insuficiência renal e parada cardíaca.

Os primeiros relatos foram descritos em 1924 numa região litorânea próxima ao Mar Báltico que, naquela época, era denominada Könisberg Haff, daí o nome da síndrome. Atualmente, esse local integra a cidade de Kaliningrado, que pertence à Rússia e faz fronteira com a Lituânia e Polônia.

A Síndrome de Haff está associada ao consumo de diferentes espécies de pescado, tanto de água doce como de mar. Há surtos de casos relatados na Rússia, Suécia, Estados Unidos (1984, 2001, 2014), China (2010) e no Brasil (a partir de 2008), todos envolvendo o consumo de pescado.

O MAPA informou, através de uma nota técnica recente, que os primeiros sinais e sintomas podem se manifestar nas 24 horas após o consumo de peixe cozido, lagostim e outros frutos do mar contaminados. "A enfermidade é considerada emergente e, por ter origem desconhecida, enquadra-se como evento de saúde pública (ESP), sendo considerada de notificação compulsória", diz a nota.

A cronologia no Brasil

Os primeiros casos da doença de Haff registrados no Brasil foram em 2008, com origem em espécies de água doce como o pacu (Mylossoma spp), tambaqui (Colossoma macropomum) e pirapitinga (Piaractus brachypomus), bem como em peixes de água salgada, como arabaiana/olho-de-boi (Seriola spp) e badejo (Mycteroperca spp), onde 27 pessoas foram acometidas no Amazonas.

Foram também registrados 100 casos no surto que ocorreu na Bahia, entre 2016-17, com 2 óbitos e, agora, em 2020/21, outro surto com 200 casos (2 óbitos confirmados até o momento), envolvendo os estados da Bahia, Pernambuco, Alagoas, Ceará, Amazonas e Pará. Diante da situação, o MAPA está orientando a população a ficar atenta na hora de comprar pescado (peixe, mariscos e crustáceos, moluscos), dando preferência para a compra destes alimentos com o selo dos órgãos de inspeção oficiais, seja o federal (SIF), estadual (SISP, no caso de São Paulo), ou municipal, porque produtos identificados pelo carimbo de inspeção na rotulagem possibilitam a rastreabilidade de sua origem, o que os torna seguros.

O que se sabe efetivamente?

Esta doença foi pouco estudada até hoje. Esforços estão sendo realizados para se conhecer a Síndrome de Haff e identificar suas causas, meio de transmissão e formas de tratamento. Os estudiosos alertam que a relação com o consumo de pescado é fato que não pode ser negado, entretanto, o aumento no número de casos pode se justificar pelo fato de que, na atualidade, há mais notificação e não necessariamente a maior ocorrência de casos.

A ausência de febre, de sintomas gastrointestinais e de resultados laboratoriais de infecção na análise dos surtos ocorridos no Brasil permitiram que um grupo de pesquisadores concluíssem que provavelmente o agente causador da Síndrome de Haff é uma toxina (Bandeira et al., 2017). Aliado a estes argumentos, há o fato da ação se dar num espaço de tempo tão breve após a ingestão que não permitiria a proliferação de microrganismos para gerar os efeitos relatados. A hipótese de que seja uma toxina estável à temperatura é bastante aceita, pois foram relatados casos de contaminação onde houve ingestão de peixe cozido e peixe cru.

Há tratamento para a Síndrome de Haff?

De acordo com o Ministério da Saúde, a hidratação é muito importante nas horas seguintes ao aparecimento dos sintomas, para diminuir a concentração da toxina no sangue e favorecer sua eliminação do organismo através da urina. Em casos mais graves é necessário fazer hemodiálise.

Na maioria das vezes, o quadro costuma evoluir bem, mas há risco de morte, especialmente em pessoas com comorbidades. Procurar ajuda logo após o aparecimento dos primeiros sintomas e ter o diagnóstico o mais rápido possível é fundamental, pois como se viu a toxina age rapidamente.

Não há nada específico que possa ser feito para evitar a enfermidade. Não existem formas de identificar a toxina pois ela não tem cheiro, gosto ou cor e não desaparece após o cozimento do pescado. Não se trata de doença transmissível entre as pessoas, a transmissão ocorre através da ingestão de pescado contaminado.

Como agir?

A indicação é comprar o pescado em locais onde se conhece sua origem e o processo de transporte e armazenamento. É importante o consumidor ser cuidadoso ao adquirir seu pescado e verificar se é inspecionado, se o local possui registro junto ao serviço de inspeção para garantir sua segurança de consumo. O ideal seria que todo pescado fosse rastreável, pois assim saberíamos onde e como cada pescado foi produzido e qual seu caminho até a mesa do consumidor, o que permitiria, inclusive em situações como a da Síndrome de Haff, identificar geograficamente a origem do problema, para tomar as medidas necessárias para controlá-lo e indicar restrições sem prejudicar outros comerciantes que estão longe do local.

Próximos passos...

O MAPA e o IFSC, juntamente com o Ministério da Saúde, seguem realizando o estudo para identificar o agente causador da Síndrome de Haff e comprovar (ou não!) a hipótese de que se trata de uma toxina termoestável produzida por organismo aquático (dinoflagelado, talvez).

Fica clara a necessidade da integração de vários setores como Saúde, Agricultura, Meio Ambiente, Comércio e Produção para lidar com situações como esta que afetam diretamente a Saúde Pública da população, onde a Pesquisa Científica é fundamental para antever cenários e para garantir o bem-estar, a saúde da coletividade e a economia.

Dra. Rúbia Yuri Tomita

Pesquisadora Científica

ULRTP/Instituto de Pesca-APTA/SAA

 

Referências e materiais de consulta

Bandeira AC, Campos GS, Ribeiro GS, Cardoso CW, Bastos CJ, Pessoa TL, Araujo KA, Grassi MFR, Castro AP, Carvalho RH, Prates APPB, Gois LL, Rocha VF, Sardi SI. 2017. Clinical and laboratory evidence of Haff disease – case series from an outbreak in Salvador, Brazil, December 2016 to April 2017. Euro Surveill. 2017;22(24):pii=30552. DOI: http://dx.doi.org/10.2807/1560-7917.ES.2017.22.24.30552

https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/mapa-monitora-casos-de-doenca-de-haff

https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2021/09/10/doenca-da-urina-preta-estados-registram-casos-de-sindrome-relacionada-ao-consumo-de-peixes.ghtml

https://administradores.com.br/noticias/doenca-da-urina-preta-pode-estar-relacionada-a-consumo-de-frutos-do-mar

https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/metro/o-que-se-sabe-sobre-a-doenca-de-haff-conhecida-como-doenca-da-urina-preta-1.3130289

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